O tão aguardado iPad
Ele chegou. Será que é tudo isso mesmo?

iPad, iPad, só se fala no iPad – pelo menos no mundinho de quem é ligado em tecnologia.

A Apple mais uma vez conseguiu fazer barulho. Foram meses de especulação e expectativa em cima desse lançamento. E finalmente a empresa mostrou seu tablet. Um equipamento bonito, elegante e, segundo muitos, revolucionário.

Todo esse burburinho em torno do equipamento, antes, durante e depois do lançamento, me fez pensar. Não dá para não considerar o que aconteceu como algo novo na sociedade, característico dessa nova geração. É aí que o iPad encontra a Geração Beta, e vice-versa. Nós seremos os testadores desse novo aparelho e, principalmente, do conceito que ele nos apresenta.

Para analisar o que se passa, precisamos decupar o assunto em três aspectos:

1- O hype

A primeira lição que podemos aprender com o iPad é sobre nós mesmos. Em 2007, com o lançamento do iPhone, vimos algo semelhante, mas dessa vez as coisas ficaram mais claras.

Troco esse lindo espelho por um iPad. Topa?
Troco esse lindo espelho por um iPad. Topa?

Ficou evidente como a tecnologia nos seduz. Ficamos absolutamente absortos, por vezes até perdemos a razão frente a novas possibilidades. Somos os índios encantados com os espelhinhos dos portugueses, que não percebiam que aquilo era mais um artifício para a dominação colonialista. Só que hoje a conquista é de mercado. E a Apple reúne as habilidades dos conquistadores portugueses, ingleses e espanhóis juntos.

Somos crianças pequenas diante de novos brinquedos. Temos aquela mesma compulsão do ter, conhecer, saber, tocar.

Só isso justifica o tamanho interesse a respeito do iPad antes mesmo dele ser lançado. Os jornalistas especializados, espécies exemplares da Geração Beta (a grande maioria com idades entre 20 e 30 anos), são facilmente seduzíveis. E fizeram a lição de casa que a Apple queria. Disseminaram os rumores plantados pela empresa (leia esta matéria e entenda), especularam sobre as características do tablet. Aumentaram tanto o interesse no lançamento que até os investidores foram capturados, fazendo as ações da empresa dispararem com a iminência do anúncio oficial. Os blogueiros também não resistem à magia desses gadgets. Fãs e os não-fãs da marca postaram milhares de textos sobre o pseudo-produto. E o buzz e o hype só fizeram aumentar.

Não coloco nenhum juízo de valor ao constatar essa entrega à sedução do objeto tecnológico. É apenas um fato facilmente constatável. Eu apresento claramente esses sintomas.

É quase impossível não se imaginar nesse admirável mundo novo de aparelhos que só víamos em ficção científica. Queremos participar dessa revolução, queremos ver onde tudo isso vai dar. Nossa carência por consumo não é causada por nossas necessidades atuais e sim por necessidades projetadas num futuro provável. Cria-se o vazio de amanhã, que deverá ser preenchido ainda hoje.

E é justamente esse o mecanismo que propulsiona a inovação. É o combustível das descobertas. Pagamos caro por pequenos aparelhos que vamos jogar fora em um ou dois anos. E assim a indústria se recicla e nós produzimos mais e mais lixo eletrônico.

2- O aparelho

Parece mas não é.
Parece mas não é

A Apple finalmente apresentou seu novo equipamento. Trata-se de um tablet, ou seja, um computador sem teclado com tela sensível ao toque. É realmente muito bonito, não dá para negar seu apelo estético. Parece um iPhone gigante. E é. Possui o mesmo sistema operacional, ou seja, funciona igualzinho, só não faz ligações.

A respeito do aparelho em si, pouco posso falar, pois ainda não pude ver um de perto. Mas, em minha opinião, tem algumas falhas e muitos pontos positivos. Não vou fazer nenhum review. Você pode googlar e achar sites especializados que até tiveram a oportunidade de experimentar o iPad.

Para começar, acho que ele não deve se tornar um leitor de livros definitivo, pois não tem tela com a tecnologia de e-paper. Por mais moderna e agradável que seja a nova tela de LED, esta nunca conseguirá oferecer o conforto visual do papel ou das telas de e-readers nativos como o Kindle. O iPad também peca nas conexões. Deveria ter pelo menos uma porta USB para conectar-se a uma câmera ou HD externo, e uma saída de vídeo para ligá-lo a uma TV. E poderia ter uma câmera frontal embutida para realizar chamadas de vídeo pelo Skype. Todo mundo já falou isso e os defensores da marca fizeram questão de contra-argumentar.

Para mim, a Apple vai com muita sede ao pote, ou melhor, aos nossos bolsos. Logo lançarão uma versão com câmera. E quanto às saídas USB e vídeo, eles preferem nos encher de acessórios para conectar o dispositivo a outros.

Vejo esse como um ponto crucial. O iPad, por não se conectar facilmente com uma câmera ou HD fica invariavelmente dependente de um outro computador para ser alimentado, pelo menos por enquanto (leia-se: próximos cinco anos). Isso é um belo ponto negativo, pois impede que ele seja a solução simples a que se propõe. Sendo um equipamento autônomo, se tornaria muito mais relevante e teria muito mais valor. Mas a Apple aposta no futuro, não é? Vamos esperar as conexões de celular e wi-fi se tornarem ultra-rápidas para o iPad mostrar toda sua força (mas será que ele ainda será tudo isso nessa ocasião??).

Lindo, leve mas não solto. Onde estão as conexões?
Lindo, leve, mas não solto. Onde estão as conexões?

De resto, acho o aparelho muito, muito bom. A tela é linda, com a ressalva para leituras prolongadas, e o fato do sistema ser o mesmo do iPhone traz uma vantagem enorme. O aparelho não precisa de manuais de uso. Você instala um novo programa, comprado na excelente App Store da Apple e não se preocupa com mais nada. Vai ser tudo compatível, nada vai comprometer o desempenho do aparelho, pois os softwares são previamente aprovados pela Apple. Seus documentos serão salvos pelos programas (você não precisa se preocupar aonde gravar, nem como achá-los depois). Tudo é mais intuitivo, simples e amigável. É uma nova experiência de computação. Mas vale lembrar que isso tem um outro lado, ruim, pelo menos para nós consumidores. Estaremos sempre presos à Apple. Se algum desenvolvedor criar uma aplicação para o iPad que vá de encontro aos interesses da empresa, esse programa não será oferecido, mesmo sendo muito útil para os usuários. O Google, veja bem, o Google, tentou oferecer um programa para efetuar ligações telefônicas gratuitas no iPhone através de redes wi-fi e foi proibido, pois ia de encontro aos lucros das empresas de telefonia parceiras da Apple. Isso VAI acontecer com o iPad. Será que poderemos comprar livros e músicas de outras lojas senão da iBook Store e iTunes Store? Com certeza existem outras maneiras de oferecer uma ótima usabilidade sem ser tão restritivo e ganancioso. Esse pra mim é o pior lado da Apple e poucos fãs da marca conseguem admitir isso. Vamos torcer para que o sucesso possa forçar a marca a mudar essas atitudes.

3- O conceito.

Uma coisa ninguém pode negar. A Apple inovou mais uma vez. Parecia óbvio, mas ninguém fez antes.

Aqui eu gostaria de abrir um parênteses e falar sobre as outras marcas.

Ficamos mais de um ano ouvindo os rumores sobre o provável tablet da Apple. Em blogs víamos fantásticas previsões e possibilidades de como seria o aparelho. O próprio iPad não é tão bom como as previsões. Mas nenhuma outra empresa se aproveitou dessa enorme e rica fonte de informações e idéias para criar um produto próprio. Tiveram que esperar a Apple lançar pra depois correr atrás. Caramba! Que gestão de inovação é essa??? Executivos da Nokia, HP, Microsoft, Dell, por favor, me respondam!

De volta ao conceito.

O iPad representa um novo paradigma na relação do homem com o computador. A mobilidade ganhou nova forma. Notebooks são pesados e desconfortáveis. Smartphones são pequenos demais. Netbooks não são tão atraentes. O iPad revoluciona porque é totalmente touchscreen, tem um sistema simples, bonito e funcional, tem uma tela maravilhosa e adequada para o consumo de informação (vídeos, leitura rápida e navegação na web), além de ser leve e também permitir a utilização de programas de produtividade, como editores de texto, planilha e apresentações. Finalmente a internet pode ir conosco aonde quisermos, de maneira plena e confortável. Isso é realmente um passo à frente em direção à simbiose homem-máquina. Mas as possibilidades desse novo conceito não acabam aí.

Concordo que o iPad pode vir a ser um novo modelo de computador para a educação. Nada daqueles notebooks feios e fracos que tentavam vender ao governo. O iPad pode substituir os livros, apostilas e cadernos de todas as crianças. Na mochila dos nossos filhos iria só ele e o lanche.

O iPad também pode se tornar uma ferramenta extraordinária de inclusão digital, tanto para as populações de baixa renda como para pessoas mais velhas que têm dificuldades com os computadores atuais. É relativamente barato e muito simples.

Mas aí esbarramos com o problema da conectividade do aparelho e sua consequente falta de autonomia como único computador da casa. Por isso, quando eu falo iPad, leia-se a categoria que a Apple criou, ou seja: os novos tablets.

Esse conceito tem um futuro promissor, independente se for com o iPad ou com outro aparelho melhor que alguma marca venha a lançar (assim espero).

iBooks Store. Compre djá!

Existe mais um aspecto do conceito lançado pela Apple que vai mudar o jeito como consumimos informações. Trata-se de uma decorrência de outras inovações: a iTunes Store e App Store se juntam com a nova iBooks Store como as alimentadoras dos gadgets da marca. Esse movimento revolucionou a indústria cultural e trouxe talvez mais lucros para a Apple do que a venda de seus aparelhos.

A iTunes Store mostrou um novo modelo de negócios e foi a luz no fim do túnel para as gravadoras. A App Store criou um vibrante nicho de mercado para desenvolvedores de softwares. E agora, a iBooks Store também promete salvar editoras, jornais e revistas e colocar mais um punhado de dólares no bolso do Steve Jobs.

O conceito de aparelhos que se auto-alimentam de conteúdo, possível com o aprimoramento das tecnologias wireless, é para mim, o futuro do comércio de bens culturais. A Apple, como produtora de software e de hardware, atrela suas lojas de conteúdo aos seus outros produtos. E esse talvez seja o mapa da mina, pois temos hardwares e softwares que se integram perfeitamente com essas lojas virtuais. Não existe nada mais fácil do que usar o iTunes para comprar música. O próprio tocador faz tudo. Não precisamos sair, visitar um site, comprar, baixar e depois voltar ao tocador. O iPad vai seguir a mesma lógica.

Agora, se isso vai salvar a indústria cultural, a história é outra. Primeiro porque o iPad não é um leitor de livros nato. Quero ver alguém ler Guerra e Paz numa tela luminosa e de alto contrate. Depois, porque o sucesso desse empreendimento também depende do outro lado. As editoras, os jornais e as revistas precisam se adaptar para lançar produtos que possam tirar mais proveito desse novo meio, o eletrônico. E quando pensamos em inovação, gravadoras e editoras estão lá no fim da fila.

Conclusão:

A meu ver, o lançamento do iPad é muito mais importante do que o iPad em si, pois nos mostra o que somos, onde estamos e para onde podemos ir.

Não devemos tirar os méritos da Apple, afinal é a empresa que coloca a mão na massa, apesar de suas falhas. Na verdade, quem mais peca são as concorrentes, que parecem inertes e acomodadas com modelos antigos.

Kindle e Sony Reader. Melhores para ler, piores para todo o resto. Será que conseguem chegar lá?

Se eu vou comprar um iPad? Não tão cedo. Não pretendo trocar minha oca por esse espelhinho tão facilmente. Prefiro esperar pra ver se outros navios desembarcam por aqui trazendo bugigangas mais interessantes. Mas que eles não demorem muito, senão…

 

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