Super-humanos, sub-humanos ou inumanos?

Tenho acompanhado um assunto com muito interesse há algum tempo: as inovações tecnológicas a respeito da relação homem-máquina. O caderno Link, do Estadão, de 20/11/09, trouxe uma série de reportagens sobre este tema. Vamos ver algumas coisas:

Intel inside?


“A Intel planeja que, em 2020, nossas mentes poderão controlar computadores, celulares e televisores. Nada de controle remoto, mouse ou teclado. Segundo pesquisadores do Intel Labs de Pittsburgh, em até dez anos já teremos chips implantados no cérebro, que permitirão que controlemos tudo apenas com nossos pensamentos.”

No futuro, as cabeças estarão em redes

“Em 2045, o homem fundido com a máquina irá multiplicar em bilhões de vezes a sua inteligência, comparando com o que somos. Nesse ponto, será tão simples fazer um backup do nosso cérebro quanto fazemos o do nosso computador”


Além do Link, algumas matérias do site Inovação tecnológica:

Eletrodos plásticos tornam chips neurais compatíveis com cérebro.

“Os chamados “chips neurais” – implantes capazes de captar os sinais elétricos gerados pelo cérebro – estão sendo utilizados em várias interfaces cérebro-máquina, para o controle de robôs, equipamentos de auxílio ao movimento, como cadeiras de rodas, e em pesquisas mais avançadas para desvendar as causas de doenças neurológicas, como o Mal de Alzheimer. O chip neural considerado como o mais avançado já apresentado até hoje é capaz de evoluir e aprender com o cérebro onde está implantado.”

Chip bioeletrônico conecta neurônios a circuito eletrônico.

“Engenheiros do instituto de microeletrônica IMEC, da Bélgica, criaram um microchip formado por uma série de pilares nanométricos que permite a conexão direta entre células vivas e dispositivos eletrônicos.”


Sem entrar em detalhes técnicos, tudo isso quer dizer o seguinte: estamos pesquisando e já conseguindo resultados animadores para a criação de implantes cerebrais, ou se formos mais além, métodos não invasivos para que o homem e a máquina se comuniquem diretamente, sem a mediação de teclados, mouses ou telas, como leitura das nossas ondas cerebrais.

O cyber-Hawking
Pessoas desabilitadas poderiam explorar o máximo de suas mentes com ajuda da robótica.

Em relação aos implantes neurais, o primeiro, e óbvio,  benefício seria a cura ou a solução de problemas neurológicos, que vão do Alzheimer à paralisia, passando por cegueira e surdez. São realmente maravilhas e romperiam paradigmas da engenhosidade humana. Até uma pessoa sem olhos poderia voltar a enxergar, já que uma câmera ligada ao nervo óptico poderia transmitir imagens para o cérebro.

Indo além da medicina, e as empresas que estão por trás dessas pesquisas com certeza estão indo, temos as aplicações meramente computacionais. Ou seja, a criação de sistemas híbridos humanos-máquinas. Computadores desenvolvidos com biochips, programados para poderem pensar de forma análoga ao homem; ou homens com implantes cerebrais que permitam acesso instantâneo a toda gama de informações disponível digitalmente. Imagine: você quer saber o significado da palavra cyborg, você realiza um comando mental e automaticamente a informação é transmitida diretamente para o seu cérebro. Você poderia também dirigir carros com o poder do pensamento, poderia fechar os olhos e instantaneamente consultar o mapa que deseja.

Seria realmente um admirável mundo novo. Ou melhor, será. Nada disso é ficção. Bilhões de dólares estão sendo investidos em pesquisas sérias neste rumo. Entre nos links, pesquise e comprove.

Finalmente as mulheres vão conseguir um corpinho perfeito e que não envelhece? O problema vai ser trocar o chocolate por WD-40.

Mas quem já leu o livro de Aldous Huxley sabe o por quê d’eu ter usado esta expressão. Para quem não leu, o livro trata de uma sociedade no futuro onde tudo é controlado a partir de uma idéia de bem comum onde o caráter humano simplesmente desaparece em função do social. Homens são criados artificialmente e a inteligência destinada a cada ser é distribuida conforme a classe social a que este pertencerá. Trata-se de uma fábula de uma sociedade autoritária sem ditador, onde todos vivem em um estado de aceitação e felicidade induzida por uma droga tipo Prozac.

Voltando ao ponto, o que me chama atenção em todas essas maravilhosas notícias sobre o desenvolvimento tecnológico e as pesquisas no campo da neurotecnologia é a ausência de uma análise que vá além do deslumbramento.

Estamos no meio da revolução e, justamente por isso, não sabemos o caminho que estamos trilhando. Tá certo que curar cegos, paralíticos e tantas outras enfermidades é realmente incrível. Agora, ter um chip no cérebro ou ter um computador que lê a minha mente, isso eu não sei se acho muito legal.

Os teóricos da conspiração com certeza concordam comigo. Só de lembrar o Skynet, me dá frio na espinha. Imagine um Skynet controlando diretamente esses chips cerebrais.

Mas não é só por medo de uma revolução consciente das máquinas que escrevo isso. Acho que estamos construindo rapidamente um futuro que não sabemos onde vai dar. Só para começar: a perda do humano e o abismo social entre ricos e pobres, que será um abismo entre espécies diferentes (os humanos-máquinas/os genéticamente perfeitos X os pobres humanos de antigamente).

Paz ou guerra, para onde essa revolução nos levará?

E olhando a evolução do pensamento humano, dos valores da nossa sociedade, vejo um mundo cada vez mais individualista, hedonista e violento. As pessoas atiram os carros umas nas outras, xingam-se, trapaceiam. Isso é uma regra e quem frequenta o mercado de trabalho sabe o que estou dizendo. Quem anda no trânsito também. Logo, logo, essas pessoas estarão equipadas com chips neurais, serão uma nova espécie de indivíduos…e o que farão com isso? Simplesmente ficarão vendo filminhos do Youtube com os olhos fechados? Sobre que base ética viverão esses seres? O que está norteando toda essa nova tecnologia é apenas uma curiosidade símia e um gosto pelo entretenimento barato?  Meu ponto de vista é esse: enquanto filosoficamente o homem está cada vez mais pobre, a disponibilidade dos avanços tecnocientíficos está cada vez maior. Estamos nos animalizando enquanto seres sociais e evoluindo enquanto entidades biológicas, através de melhorias genéticas e a fusão com a máquina. Por isso eu pergunto: frente à todas as novidades, todas as possibilidades que a tecnologia está criando e impondo às nossas vidas, o que irá acontecer, transformaremos nossa raça em super-humanos, sub-humanos ou em inumanos?

Taí uma questão que irá afetar nossos filhos e netos. Não duvide disso. Comentários e críticas serão bem-vindos.

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